Eu fundei o Viva Real em 2009. Depois de uma década, fizemos uma fusão com a ZAP e então fomos adquiridos pela OLX em uma transação de US$ 640 milhões. Infelizmente, não foram só boas notícias – acabamos pagando mais de US$ 100 milhões em impostos por conta de um erro de principiante.
Aqui eu compartilho o que aprendi no processo, e como você pode evitar seguir o mesmo caminho.
Como um fundador de primeira viagem, eu não tinha a menor ideia do que estava fazendo quando decidi construir uma empresa. No começo, eu acabei pegando muitos atalhos porque o dinheiro estava curto. (E isso acontece na maioria das startups.)
No começo do Viva Real, perguntei ao meu contador nos Estados Unidos como eu deveria montar nossa estrutura corporativa. Como eu não tinha experiência com capital de risco ou com a América Latina, ele sugeriu que eu abrisse uma LLC na Califórnia. Eu fiz isso, e tudo funcionou bem – por um tempo.
Quando começamos a conversar com os investidores, eu percebi que a gente precisaria de uma estrutura internacional mais sofisticada para levantar investimentos. À medida que o negócio amadureceu, procurei assistência jurídica para ter certeza de que estávamos no caminho certo. Eu conversei com advogados do Vale do Silício na esperança de conseguir um plano de ação claro, Mas, embora eles tivessem familiaridade com capital de risco, não conheciam bem as startups da América Latina.
O conselho que eu recebi foi montar uma empresa Limitada no Brasil para as operações do dia a dia, e substituir a holding da LLC na Califórnia por uma C-Corp em Delaware. Parecia uma boa ideia na época.
Os investimentos de capital de risco não eram tão comuns na América Latina antigamente, então a gente não sabia como se preparar até isso se tornar uma possibilidade. Eu segui os conselhos que me deram e então consegui levantar capital de investidores internacionais.
O problema é que nós éramos uma startup brasileira focada apenas no mercado local, com zero operação nos Estados Unidos. Ao criar uma C-Corp, nos submetemos a impostos corporativos nos Estados Unidos no caso de uma exit.
Como nós já havíamos levantado algumas rodadas de investimento a essa altura, mudar nossa estrutura seria complicado e caro. Estávamos em maus lençóis, e tivemos que engolir o sapo e deixar para nos preocupar com o problema quando ele começasse a incomodar.
E então chegou 2017, quando decidimos fazer a fusão com a ZAP, nossa maior concorrente no mercado imobiliário. Nós contratamos os melhores advogados e contadores para garantir que tudo corresse bem. Eu lembro de estar sentado no meu carro ouvindo esses caras, cada um cobrando de US$ 500 a US$ 1.000 por hora, sabendo que tinha pelo menos umas 8 ou 10 pessoas em cada ligação, e calculando na minha cabeça o quanto aquele negócio estava custando por minuto.
Depois de analisar vários cenários e debater mil e uma possibilidades, chegamos a uma solução que acreditávamos que funcionaria. Custou milhões de dólares e levou meses para fazer acontecer, mas adicionamos uma holding de Cayman no topo da estrutura corporativa combinada das duas empresas. Achamos que o problema tinha acabado por aí.
Em 2019, eu abri a minha caixa de entrada e encontrei um e-mail que mudaria minha vida: uma oferta em dinheiro de mais de US$ 600M para comprar o Grupo ZAP Viva Real.
Tínhamos acabado de passar a maior parte de 2018 tentando levantar uma rodada de investimentos sem sucesso, e tomamos a decisão de negociar com a OLX porque parecia a aposta mais segura. Nossa estrutura societária nesse momento era composta por empresas operacionais no Brasil, uma intermediária C-Corp em Delaware nos EUA e uma holding nas Ilhas Cayman. Para nós, o ideal seria vender a entidade das Ilhas Cayman.
A OLX disse “sem chance”, e isso foi como um tapa na cara. Por conta do nosso histórico de conversão de uma LLC para uma C-Corp, os advogados da OLX disseram que era muito arriscado nos comprar em Delaware. A oferta deles foi para comprar as ações das empresas com operações locais.
A C-Corp em Delaware detinha 100% das ações de todas as nossas subsidiárias locais, e a transação tecnicamente contaria como venda de ativos. Então, nós não só teríamos que pagar os impostos corporativos de praxe, como também teríamos que bancar os impostos sobre ganhos de capital nos Estados Unidos.
Somando esse valor a todos os impostos individuais aos quais estávamos sujeitos, mais de US$ 100 milhões foram pagos ao governo dos Estados Unidos por um negócio que nunca ganhou um centavo lá – tudo por causa de uma má decisão legal.
Desde então, eu venho abrindo o jogo sobre esse erro na esperança de que outros fundadores não o repitam.
No final das contas, construir algo de extremo valor significa que você precisa enfrentar esses tipos de desafios, mas você não precisa reinventar a roda: todos esses erros são evitáveis e podem ser resolvidos se você se permitir aprender com os outros e suas experiências.
Eu sei que falar com advogados não é tão glamoroso quanto vender para clientes ou desenvolver um MVP, mas se tem uma coisa que eu posso te falar dos 11 anos que passei construindo minha antiga empresa, é que investir um tempo como fundador para montar a estrutura corporativa certa desde o começo vai te poupar dinheiro (e dor de cabeça) no futuro.
As LLCs em Delaware são conhecidas como entidades de passagem, o que significa que não estão sujeitas a impostos corporativos federais como empresa. A responsabilidade fiscal é repassada aos proprietários. Um ponto de atenção é que o patrimônio de uma LLC não está estruturado da maneira como estamos acostumados. A LLC tem unidades de participação em vez de ações, e criar preferências de liquidez para os investidores dá um pouco mais de trabalho. Além disso, se a LLC for lucrativa, os proprietários podem ter que pagar imposto de renda sobre a sua participação nos lucros, mesmo que estes não sejam distribuídos.
Por outro lado, as C-Corps usam a estrutura normal de ações para dividir a participação na empresa, e podem facilmente acomodar classes de ações preferenciais. A desvantagem é que elas pagam impostos corporativos todos os anos e também quando vendem ativos, resultando no que é conhecido como dupla tributação – pagar impostos como empresa e como pessoa física.