Passar de uma empresa operacional na América Latina para uma estrutura corporativa offshore é um requisito comum para startups que planejam levantar capital internacional. Chamamos o processo de "flip".
Quando você decidiu iniciar um negócio na América Latina, você deu o passo mais óbvio: criar uma pessoa jurídica em seu país de atuação. Em termos legais, o dia-a-dia da sua startup está indo muito bem desde então. Tanto é assim que agora é a hora de dar o próximo passo: conversar com investidores internacionais e captar recursos.
Porém, talvez você precise alterar a estrutura corporativa da sua startup para se adequar aos requisitos dos fundos de venture capital.
"Montar uma estrutura corporativa internacional sem dissolver a empresa existente e incorporar uma nova pessoa jurídica do zero" pode parecer muito específico, mas vou te contar um segredo: muitos outros fundadores de startups passaram pelo mesmo problema.
A solução na verdade tem um nome bem simples e conhecido: flip. E, com a orientação certa, você pode mudar a estrutura da sua empresa sem grandes problemas.
Imagine que você fundou uma empresa, encontrou seu product-market fit e conquistou vários clientes. Agora, você está em negociações para levantar uma rodada de investimento semente de US$ 1 milhão liderada por um famoso fundo de capital de risco dos EUA. Tudo parece perfeito.
Mas, conforme o fundo de VC está se preparando para fechar um acordo verbal com você, os investidores informam que não podem injetar capital diretamente em sua empresa local na América Latina.
Mas por que não?! Quando se trata de fazer investimentos, os VCs estão muito interessados em ter governança previsível. Investidores não podem avaliar com precisão o risco envolvido se não puderem antecipar e planejar o pior cenário, e como é possível fazer isso em um país com leis e possíveis responsabilidades desconhecidas?
Você deve estar pensando que isso não é o fim do mundo, certo? Teoricamente, você poderia simplesmente abrir uma nova pessoa jurídica e transferir os direitos de propriedade intelectual. Mas lembre que você investiu suas economias de uma vida inteira para manter o negócio funcionando antes que ele fosse lucrativo. Você tem clientes. Você tem funcionários.
Só pensar em como mover tudo isso e não ter problemas com as autoridades locais pode ser suficiente para tirar seu sono (eu já perdi o meu).
E se eu te disser que existe outra forma de fazer isso?
É para isso que serve um flip. Ele permite que você mantenha a pessoa jurídica original em seu país de operação enquanto adiciona uma ou mais holdings no topo. Em vez de possuir ações da empresa em seu país na América Latina, você terá ações da holding, que por sua vez será dona de 100% da operadora.
Um flip pode se tornar necessário se:
• Como vimos: um ou mais potenciais investidores exigem que você tenha uma empresa offshore antes de se comprometer a assinar um cheque.
• Sua empresa está se expandindo para diferentes países e você gostaria de centralizar todas as pessoas jurídicas sob a mesma estrutura.
• Você está negociando uma fusão ou aquisição e a outra parte exige que uma empresa offshore realize a transação.
• Sua empresa está se preparando para fazer uma Oferta Pública Inicial (IPO) em uma bolsa de valores estrangeira.
Quais são os principais passos de um flip?
Quando um flip é feito corretamente, sua propriedade intelectual e participação acionária na empresa estarão protegidas. É por isso que é importante ressaltar: você definitivamente precisará de aconselhamento jurídico para mudar sua estrutura corporativa.
Com a ajuda do seu advogado de confiança, o processo de flip da sua empresa será o seguinte:
1. Criar uma empresa offshore
Você primeiro precisará incorporar no país ou países de sua escolha. O processo de incorporação é muito diferente de país para país, e as escolhas mais comuns para fundadores latino-americanos são as Ilhas Cayman e os EUA.
Nesta etapa, o cap table da nova empresa será puramente simbólico e será alterado posteriormente. Portanto, não se preocupe tanto.
2. Deixar a nova empresa nos conformes com a lei
Para que uma empresa offshore seja proprietária de uma empresa local, pode haver requisitos legais dependendo da localização – por exemplo, entidades estrangeiras que possuem ações de empresas brasileiras precisam se registrar para obter um número de CNPJ, que serve para identificação fiscal.
Seu advogado poderá orientá-lo nas etapas específicas exigidas em seu país de operação.
3. Distribuir o patrimônio entre os acionistas
Agora as coisas começam a ficar boas! É hora de refletir os sócios de sua empresa original na nova. Isso normalmente acontece por meio do que é conhecido como uma transação simbólica.
Você pode pensar nisso como uma troca de figurinhas: os acionistas de sua empresa operacional trocarão as ações da empresa local por ações equivalentes na nova holding. Eles farão uma remessa internacional simbólica para ter uma trilha de papel que possa ser registrada com os reguladores locais, de acordo com os requisitos e implicações fiscais do país de operação.
A distribuição de patrimônio antes e depois do flip pode ser visualizada assim:
4. Estabelecer representação legal no país de operação
Uma vez que sua nova e brilhante estrutura corporativa esteja configurada, ela precisará de representantes legais nomeados em seu país de operação, já que, tecnicamente falando, a nova entidade legal é a única proprietária da empresa original.
Você precisará assinar uma procuração para alguém em nome de sua holding offshore, e esta pessoa será encarregada dos poderes e responsabilidades de representar a entidade estrangeira a nível local. O representante é geralmente um dos co-fundadores.
5. Informar as autoridades sobre os Beneficiários Finais
Estamos quase na linha de chegada. Dependendo do país de operação, você precisará informar às autoridades quem são os indivíduos por trás de sua estrutura corporativa. Isso não será obrigatório para todos os países da América Latina, mas é um requisito comum em vários países da região. Seu advogado será capaz de orientá-lo melhor sobre as especificidades do seu caso.
Quanto tempo leva para fazer o flip de uma estrutura corporativa?
A resposta vai depender da complexidade do seu caso específico e da estrutura corporativa em que você gostaria de adotar. Quanto mais acionistas você tiver em seu cap table, mais tempo levará para que as coisas sejam organizadas.
Um flip leva pelo menos 6 semanas desde o início até o final, mas o cronograma pode se estender facilmente se você tiver levantado várias rodadas de investimento. Certifique-se de definir expectativas claras com seus consultores para entender quanto tempo todo o processo levará.